Poderia ser uma estória macabra descrita por um autor de sci-fi distópica ou uma cena de um filme futurista de Neil Blomkamp ou Alex Garland: drones sobrevoam um campo de refugiados disseminando por seus alto-falantes sons acabrunhantes de crianças e mulheres gritando e chorando. As pessoas, dentro de suas casas, alarmadas com o aflitivo barulho, saem correndo de seus refúgios domésticos no intento de socorrer os necessitados que clamam por ajuda, só para se descobrirem como alvos de uma saraivada de balas e bombas letais. Esta não é nenhuma cena de disaster movie, nem saiu de um romance da série Jogoz Vorazes, é “apenas” <o exército de Israel em ação em Nuseirat (veja o relato da AJ)>
Essa é a coisa mais perversa que já vi numa guerra https://t.co/BXRfqjOPjc
— Sorocaba não é Ocidente mesmo, hein (@coalacroata) April 18, 2024
Não se trata de nenhum episódio isolado: o que se desenrola nos últimos 6 meses – entre 7 de Outubro de 2023, quando ocorre a operação Dilúvio de Al Aqsa, e 18 de Abril de 2024, data em que este texto está sendo escrito – é estarrecedor ao extremo até mesmo para alguém que fez do estudo das distopias um de seus principais interesses de pesquisa. A máquina mortífera hi-tech do estado de Israel vem produzindo óbitos em massa entre a população civil com sua perversa utilização dos recursos de I.A., auxiliares no massacre que já causou mais de 40.000 óbitos e deixou mais de 70.000 pessoas feridas e mutiladas. <“The machine did it coldly”, relatou o The Guardian.>
Gaza tornou-se uma espécie de distopia encarnada e imagens de uma assustadora devastação invadem nossos feeds – pelo menos daqueles entre nós que não estamos trancados numa bolha de desinformação e ocultação. Desta vez, as wastelands não estão plasmadas em filmes de ficção, como Mad Max, Snowpiercer ou The Road, o próprio real, tal como expressado por jornalistas, fotógrafos e documentaristas, impressiona-nos com algo talvez mais tétrico do que qualquer fluxo de imagens que nos foi entregue pelos blockbusters apocalípticos e pela cultura da zumbificação. <“Isto é muito Black Mirror!”> pode ser uma frase que nos ocorra nestas circunstâncias macabras – mas talvez também nos ocorra a ideia de que em todas as suas temporadas a série nunca conseguiu imaginar algo tão atroz do que aquilo que o exército israelense está fazendo no morticínio em curso.
Diante de Gaza, devastada pela agressão bélica sionista, também é notável que emerge um jornalismo distópico. Por esta expressão, tento significar sobretudo dois elementos: 1) a distopia não parece mais passível de permanecer confinada nos domínios da ficção, ou seja, não a acessamos mais através de escritos fictícios de Orwell, Zamiátin, Atwood, Bradbury, K. Dick ou P.D. James, pois há uma profusão de reportagens, escritas ou audiovisuais, além de podcasts e documentários, que expressam algo profundamente aparentado aos worst case scenarios descritos nas narrativas de antecipação de sabor catastrofista; 2) no linguajar dos jornalistas, o termo “distopia” e derivados, como o adjetivo distópico, parecem ocorrer com frequência ascendente, o que fica evidente para aqueles que acompanham o trabalho de entidades de comunicação como a AlJazeera, a Mondoweiss, o Democracy Now! ou o MEMO.
Três exemplos de jornalismo distópico: o The Listening Post, excelente programa da Al Jazeera, abordou em Abril de 2024 as <“chocantes ferramentas de Inteligência Artificial de Israel e a cumplicidade do Google”>. O programa descreve como “palestinians now find themselves in a distopian nightmare” (os palestinos se encontram em meio a um pesadelo distópico) e explora os sistemas de I.A. de codinome Lavender e Gospel, através dos quais o exército sionista vem praticando seus massacres com auxílio de tecnologias fornecidas pelas gigantes da Big Tech dos U.S.A., a Google e a Meta.
Revelações de uma <minuciosa investigação jornalística, assinada por Yuhal Abraham, publicada pelo +972 Magazine>, traduzida para o português pelo IHU e <publicada também em Outras Palavras>, tirou os véus desta macabra aliança entre o projeto sionista de impor a limpeza étnica em Gaza e o uso de ferramentas high-tech. Se o leitor ficou moderadamente chocado com a descrição da atuação dos drones no primeiro parágrafo, talvez ficará em estado de choque ainda mais profundo ao ler que…
“Formalmente, o sistema Lavender é projetado para marcar como possíveis alvos de bombardeio todos os suspeitos de pertencerem ao braço armado do Hamas e da Jihad Islâmica Palestina, incluindo os de posto inferior. As fontes revelaram para +972 e Local Call que, durante as primeiras semanas da guerra, o exército dependeu quase que inteiramente do Lavender, que marcou até 37.000 palestinos – e suas casas – como militantes suspeitos para possíveis ataques aéreos.
Nas primeiras fases da guerra, o exército autorizava os oficiais a assumirem como válidas as listas de alvos para matar geradas pelo Lavender sem a necessidade de verificar completamente por que a máquina tomava essas decisões ou de analisar as informações não processadas nas quais se baseavam. Uma fonte declarou que o pessoal humano muitas vezes servia apenas como um “selo” para aprovar automaticamente as decisões da máquina, e acrescentou que, geralmente, dedicavam pessoalmente apenas “20 segundos” a cada alvo antes de autorizar um bombardeio, apenas para garantir que o alvo marcado pelo Lavender fosse do sexo masculino. E isso apesar de saber que o sistema comete o que são considerados “erros” em cerca de 10% dos casos e de que, às vezes, marca pessoas que têm apenas uma conexão leve com grupos militantes ou nenhuma conexão de todo.
Além disso, o exército israelense atacava sistematicamente as pessoas marcadas como alvos quando estavam em suas casas – geralmente à noite, com toda a família presente – e não durante atividades militares. Segundo as fontes, isso ocorria porque, do ponto de vista dos serviços de inteligência, era mais fácil localizá-los em suas residências particulares. Outros sistemas automatizados, incluindo um chamado “Onde está papai?“, cuja existência também foi revelada na revista +972, eram usados para localizar pessoas específicas e realizar ataques com bombas quando entravam nas casas de suas famílias.
O resultado, como testemunharam as fontes, é que milhares de palestinos – a maioria mulheres e crianças ou pessoas que não estavam envolvidas em combates – foram mortos por ataques aéreos israelenses, especialmente durante as primeiras semanas da guerra, devido às decisões do programa de IA.”
Usando estratégias que lembram a ideia de morticínio por controle remoto, levando aos extremos a covardia de massacrar em Gaza através de drones, bombardeios aéreos e outras formas de agredir à distância, o Estado de Israel tornou-se réu por genocídio no ICJ de Haia: nenhuma impunidade deveria prevalecer apenas porque os perpetradores de tais atrocidades utilizaram-se de recursos des-responsabilizantes que atribuem decisões a máquinas. <Em 2015, um presciente cartoon de Glen Lievre foi publicado em um jornal de Sydney> que demonstra bem este tipo de guerra desigual entre um dos exércitos mais bem financiados do mundo, engajado em um projeto colonial supremacista, e territórios como Gaza e a Cisjordânia, sistematicamente desprovidos, por ação do poder opressor e ocupante, de tudo o que faria a vida humana digna de ser vivida:
Em 6 meses, mais de 40.000 pessoas foram mortas – inclusive quase 15.000 crianças e adolescentes – no território palestino por uma escolha deliberada de agressão genocidária das forças armadas israelenses, que se utilizam sobretudo de armamentos e munições fornecidos pelos EUA e pela Alemanha, e contam com a cumplicidade das mega corporações sediadas no Vale do Silício.
“Genocídio é um bom negócio” parece ser a premissa seguida pelas Big Tech sedentas por lucros, ainda que venham manchados do sangue de mulheres e crianças: diante de protestos e sit-ins realizados por movimentos como No Tech For Apartheid e No AI For Genocide, o Google demitiu 28 de seus funcionários em Abril de 2024 (como noticiado por Al Jazeera, New York Times, CNN). É uma ironia sinistra que o Google queira faturar seus milhões vendendo clouds para que Israel possa transformar as nuvens de Gaza num inferno maquínico saturado de drones assassinos e aviões que bombardeiam as massas lá do alto.
Tal situação provoca a reativação de uma perplexidade que muitos pensadores e pesquisadores já manifestaram diante da desproporção entre a evolução tecno-científica da humanidade e o grau subdesenvolvido e miserável de nossa capacidade ética, sobretudo quando esta é obnubilada por tribalismo, sectarismo, fanatismo religioso e supremacismo racial – todas características que descrevem o sionismo em suas versões mais extremistas, hoje empoderadas e recebendo apoio de poderosos parceiros ocidentais. A alta tecnologia mescla-se com a bancarrota moral; os países mais ricos do planeta soçobram na barbárie crudelíssima; em Gaza, morre o mito da “moralidade superior” do Ocidente, ao qual apenas alguns ingênuos ou mal-intencionados ainda aderiam, lorota ideológica insustentável com o qual o Ocidente decadente, moralmente indefensável, tenta justificar suas atitudes atrozes e devastadoras ambições imperiais.
Um terceiro exemplo de jornalismo distópico vem somar-se à grande reportagem de Yuval e ao programa The Listening Post: no jornal português Público, Alexandra Coelho escreveu:
“Gaza já foi um campo de concentração, num tempo remoto, há cinco meses. Agora é um campo de extermínio, nos nossos ecrãs. Vi, no meu telefone, uma menina de Gaza pedir ao seu gato, com festas: quando formos mortos, por favor não nos comas. Vi gatos a rondarem gente morta no meio da rua. Cães a desenterrarem valas para comerem gente. Gente que comeu a comida dos cães, dos gatos, fez pão com isso. Que está a comer erva da rua, algas do mar com esgoto. Milhares a lutar por um saco de farinha da ajuda humanitária. Uma menina com a metade de um limão porque não há pão. Crianças na areia de Rafah a brincar de amassar pão imaginário, cozer pão imaginário, porque estão esfomeadas. Como aquele judeu que cobiçava o pão do vizinho em Auschwitz, e nos perguntou — continua a perguntar — se isto é um homem.
(…) A cada manhã acordo e mais uma estrela da TV em Israel, mais um ministro, por vezes ministra, diz: “Estou orgulhosa das ruínas de Gaza.” Ou: “Não há inocentes em Gaza, as crianças de cinco anos não são inocentes.” Ou: “Vamos matá-los à fome, destruir tudo para partirem voluntariamente.” Ou: “Nunca haverá um Estado palestiniano.” Ou: “Como se atrevem a criticar-nos? Somos os filhos do Holocausto.” Ou: “Ninguém diz a Israel o que fazer.” (COELHO, 2024)
Tais conteúdos mostram que distopia tornou-se moeda corrente na produção jornalística (e não apenas sobre Gaza, também sobre o Sudão, a Ucrânia etc.), que evadiu-se do terreno da ficção para manifestar-se no palco da História: hoje, dificilmente algum artista que se propusesse a retratar um worst case scenario em um território com aproximadamente 2 milhões de seres humanos, encarcerados dentro dos muros de um brutal apartheid, conseguiria chegar aos pés dos relatos sobre o real que nos chegam de Gaza. Este genocídio em nossos ecrãs poderia ser mais visível, gerar mais escândalo e revolta, se as redes sociais sediadas nos EUA não estivessem trabalhando para seu ocultamento ou minimização.
As mega-corporações do Vale do Silício, como a Google e a Meta (dona do Instagram / Facebook / Whatsapp), estão ambas envolvidas em problemáticas cumplicidades com o genocídio em curso. A Human Rights Watch mostrou em relatório pertinente o quanto a Meta pratica censura, shadow banning e “dois pesos, duas medidas” diante dos conteúdos publicados nas suas redes sociais de acordo com o teor da mensagem: é tchucuca com discursos pró-Israel e tigrão com todo conteúdo pró-Palestina. Outro exemplo do emaranhamento entre o genocídio e o Vale do Silício é que o Lavender, para matar civis em massa, funciona em integração com o Zapistão: como <relatou o MEMO, “a major determining factor of the system’s identification is simply if an individual is in a WhatsApp group containing another suspected militant.”>
2. SIONISMO: UTOPIA TOTALITÁRIA
Desde que iniciei meu doutorado na Faculdade de Filosofia da Universidade Federal de Goiás (FAFIL-UFG), venho dedicando uma atenção especial às expressões artísticas que expressam as catástrofes em curso na época geológica em que nos encontramos – no meio de um turbilhão de metamorfoses do mundo, em que o Holoceno, vigente nos últimos 12.000 anos, colapsa diante do caos causado por agência humana, emergindo o que muitos propõe chamar de Antropoceno. As crises são tantas – e Vladimir Safatle tem se especializado em enumerá-las e dissecá-las numa obra sui generis do pensamento crítico – que o termo <“policrise” tornou-se moda, tendo sido cunhado e desenvolvido por Edgar Morin (cf. Terre-Patrie, 1993).>
Para adicionar uma nova camada de complexidade ao debate, penso que o tema da distopia não é separável do tema da utopia – e que a policrise em que estamos imersos exige uma consideração crítica das consequências não-intencionadas de projetos utópicos. Meu esforço tem sido pensar o emaranhamento e a inter-relação entre utopia e distopia, inclusive o fato de que muitas vezes a tentativa de instalar uma utopia por uns acaba gerando uma situação distópica para outros.
Talvez esta seja uma chave de leitura do real interessante e produtiva para compreender como o movimento sionista, que tinha a utopia de criar uma sociedade para os judeus na Palestina desde o século 19, e que era <movida pela noção utópica das comunidades agrárias coletivistas (os kibutz)>, ganhou contornos distópicos após a Segunda Guerra Mundial, sobretudo em 1948, quando a ONU aprova a problemática criação de um Estado judeu que pudesse abrigar os sobreviventes do Holocausto. A “utopia sionista” chegou ao auge de sua concretização com a imposição da Catástrofe (Nakba) à população palestina, que foi expulsa da terra onde vivia há dezenas de gerações, para dar lugar à fundação violenta do estado de Israel.
Perplexo, deparo com dois usos recentes do conceito de utopia na cyber-imprensa que se referem ao projeto sionista e o genocídio em curso que este perpetra em Gaza desde outubro de 2023: no Diálogos do Sul, a utopia da “vitória total sobre o Hamas” é descrita como um objetivo impraticável e fantasioso. Ao contrário do que reza a desinformação reinante no OTANistão e no “mundo subdesenvolvido” a ele subserviente, o Hamas não é nenhum grupelho extremista, facilmente eliminável com bombardeios e execuções de seus líderes; para além da resiliência e do infatigável ânimo das brigadas AlQassam, é preciso frisar que o Hamas é uma entidade política que atua como poder público, que disputa eleições e as venceu várias vezes, e que evidentemente tem grande capacidade de aliciamento de novos militantes entre a população de Gaza.
“Exército de ocupação não pode erradicar o movimento de resistência palestino ou afirmar o controle colonial sobre o território sitiado”, escreve Villar Xavier. ” alcançar uma vitória decisiva sobre o Hamas é um objetivo inatingível. Apesar da retórica de aniquilação total do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, a realidade no terreno fala o contrário.“
Aqui se trata daquela utopia que adjetivamos como “totalitária”. A “utopia” totalitária pressupõe a destruição total da alteridade em prol de um corpo social que tende ao homogêneo, o que pode se tentar realizar através de um Estado etno-religioso autoritário e dogmático como Israel. Já que estamos em plena controvérsia sobre o legado do Holocausto, vale lembrar da “Solução Final” que o III Reich concebeu e executou para lidar com “o problema dos judeus europeus”, e no quanto a noção de uma “vitória total sobre o Hamas” (ainda que seja conquistada sobre o cadáver de mais de 30.000 civis) apresenta uma concepção e uma execução que de fato não é dessemelhante àquela do nazifascismo anti-semita.
Segundo exemplo da “utopia” sombria discutida no contexto atual: um vídeo sobre a história do sionismo desde o século 19, focado nos kibbutz, tem este título provocativo – “Utopia através da limpeza étnica“.
O sionismo apresenta hoje ao mundo a feição de uma utopia totalitária que gera efeitos concretos distópicos ao extremo: um dos melhores exemplos em 2024 é o que sobrou do Hospital Al-Shifa, o mais importante de Gaza, após os ataques do exército de Israel. Novamente, vemos aqui se manifestar o fenômeno que estou tentando enfatizar: o real supera em horror quaisquer representações fictícias; a distopia real de Al-Shifa faz até mesmo a série Riget – The Kingdom, de Lars Von Trier, empalidecer na comparação dos graus relativos de horror; qualquer série televisiva que explore as tensões e angústias dos trabalhadores da medicina diante das emergências, como E.R. ou Grey’s Anatomy, também passa a soar como um piquenique no parque no contraste com o inferno na Terra em que Israel transformou Al-Shifa e suas imediações.
Se quisermos mencionar alguns dos conteúdos mais distópicos de nossa época, podemos encontrá-los em documentos históricos escritos em linguagem jurídica e repletos de referências bibliográficas e notas de rodapé: refiro-me ao documento com o qual a equipe jurídica sul-africana acusou Israel de genocídio no I.C.J. (International Court of Justice) de Den Haag (a Corte Suprema da ONU), e <o recente Anatomia de Um Genocídio, assinado por Francesca Albanese>.
ACESSE NA ÍNTEGRA – ALBANESE, F. Anatomia De Um Genocídio. Em Inglês.
Qualquer roteirista de filme catástrofe, que ambiciona escrever um roteiro distópico e apocalíptico, explorando o filão de obras como Parasita e Bacurau, poderia facilmente inspirar-se em Albanese: o sumário de Anatomia de um Genocídio – reproduzido na sequência – é uma síntese de Gaza como distopia encarnada e oferece inúmeras evidências de que o Estado pária encabeçado pela extrema-direita sionista pode até acreditar que está numa missão divina para instalar uma utopia na Terra Santa, repleta de start-ups hi-tech e kibutzims florescentes, mas na prática, com sua arrogância diabólica, sua presunção de superioridade étnico-religiosa e seu violento projeto colonial, impôs a Gaza uma distópica aniquilação da vivibilidade no território.
Summary – “After five months of military operations, Israel has destroyed Gaza. Over 30,000 Palestinians have been killed, including more than 13,000 children. Over 12,000 are presumed dead and 71,000 injured, many with life-changing mutilations. Seventy percent of residential areas have been destroyed. Eighty percent of the whole population has been forcibly displaced. Thousands of families have lost loved ones or have been wiped out. Many could not bury and mourn their relatives, forced instead to leave their bodies decomposing in homes, in the street or under the rubble. Thousands have been detained and systematically subjected to inhuman and degrading treatment. The incalculable collective trauma will be experienced for generations to come. By analysing the patterns of violence and Israel’s policies in its onslaught on Gaza, this report concludes that there are reasonable grounds to believe that the threshold indicating Israel’s commission of genocide is met. One of the key findings is that Israel’s executive and military leadership and soldiers have intentionally distorted jus in bello principles, subverting their protective functions, in an attempt to legitimize genocidal violence against the Palestinian people.”
O topos – o lugar, o território, o espaço – tornou-se um campo de extermínio onde os palestinos são obrigados à alternativa infernal: escolher entre o deslocamento forçado (a perda do lar, do refúgio, da raiz), ou a morte violenta por bombardeio aéreo ou snipers terrestres; a subserviência completa diante do poder opressor, impositor do apartheid, ou o destino de tornar-se alvo do conluio humanos-máquinas numa empreitada de assassínio em massa; tudo isto agravado pelo uso da fome e da sede como armas de guerra; menos visível, mas não menos importante, completando esta distopia integral gerada pela utopia totalitária dos sionistas, está a destruição das terras aráveis, dos campos de oliveiras, da própria capacidade da terra de gerar alimentos, ações com as quais Israel demonstra que sua campanha de limpeza étnica dos territórios invadidos e ocupados na Palestina não apenas une humanos bestializados pelo ódio e pelo racismo com máquinas programadas para o morticínio, como também demonstra o conluio entre ecocídio e genocídio que move a criminalidade psicótica do regime encabeçado por Netanyahu.
Em um próximo capítulo, procurarei explorar como o filme Zona de Interesse, de Glazer, entrou neste contexto e tornou-se, apesar de ser um retrato dos arredores do campo de extermínio de Auschwitz durante o III Reich, num assustador emblema contemporâneo do apartheid enquanto teoria e prática do princípio, a ser aprofundado em nosso escrutínio crítico do contemporâneo, de utopia para uns, distopia para outros – princípio este cuja terribilidade é tão assustadora pois ele quase sempre pode ser expresso também como utopia para poucos, distopia para muitos.
Eduardo Carli de Moraes
Goiânia, 18 de Abril de 2024
DO MESMO AUTOR, EM A CASA DE VIDRO:
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ABRAHAM, Yuhal. ‘Lavender’: The AI machine directing Israel’s bombing spree in Gaza. Abril, 2024. In: +972. URL: https://www.972mag.com/lavender-ai-israeli-army-gaza/
ALBANESE, Francesca. Anatomy of a Genocide. UN Report, 2024. URL: https://drive.google.com/file/d/1ovDWAjAA-ALORpvUtMz0RU5rLWuvgAdK/view?usp=sharing.
COELHO, Alexandra. O fim de Israel, a Palestina e o Nosso Estado. 24 de Fevereiro de 2024. URL: https://www.publico.pt/2024/02/24/mundo/opiniao/fim-israel-palestina-estado-2081492.
MEMO (Middle East Monitor). Israel using Meta’s WhatsApp to kill Palestinians in Gaza through AI system. Abril de 2024. URL: https://www.middleeastmonitor.com/20240418-israel-using-metas-whatsapp-to-kill-palestinians-in-gaza-through-ai-system
XAVIER, Vilar. “Vitória total” sobre Hamas segue uma utopia e teatro de Netanyahu já é insustentável. In: Diálogos do Sul, Abril de 2024. URL: https://dialogosdosul.operamundi.uol.com.br/vitoria-total-sobre-hamas-segue-uma-utopia-e-teatro-de-netanyahu-ja-e-insustentavel/
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In 2021, after killing 230 Palestinians in 11 days in Gaza, the Israeli military bragged about deploying new AI technology to operate a faster + deadlier assault. Now, this technology is automating genocide.#StopTheGenocide pic.twitter.com/BDjI4wr8sh
— Visualizing Palestine (@visualizingpal) February 21, 2024
Publicado em: 19/04/24
De autoria: Eduardo Carli de Moraes
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